Talvez ainda seja cedo para uma retrospectiva do ano, pois pretendo pintar mais nas férias, mas de qualquer forma, lá vai!

Que ano horrível! Tão ruim, que até vou celebrar o seu fim e alimentar um pouco de esperança que 2022 possa ser melhor. Foi um ano de adeuses, de lágrimas nos olhos e fogo nas mãos. Que “pelo fogo a natureza se renove por inteiro”, a minha natureza no caso, não a de lá de fora, que não precisa de mais incêndios. Parentes se foram, mas a família nunca fica menor. E um coração partido nunca mais volta ao tamanho anterior. Meus olhos arderam e lacrimejaram, e tantas vezes foram parar no hospital, até com um presente de Belzebu. Meu ódio voltou-se para minha única religião e na fogueira queimei cada traço santo, cada pincelada salvadora, condenando-os ao inferno, apenas por ser incapaz de mandá-los para o Limbo. O poeta estava certo, como sempre, “a gente sempre destrói aquilo que mais ama…” Nada renasceu das cinzas. “E quanto mais você chora, suas cinzas viram lama.”

Estava lá, nas primeiras pinturas do ano, o tom de lama nos rostos placidamente santos, no Abismo diante do Narciso e nos “memento mori” cercados de vícios como o Absinto. Estava lá nos castelos borrados, pintados com aquela lama, como se buscasse edificar algo sobre a água. Mas havia algo diferente nas cores do céu depois da Tempestade, um tom de Rosa, como um farol de esperança, guiando um velho perdido até uma praia segura. Renascer na água, como num batismo.

Poucas obras em 2021, mas foram mais do que 2020 e 2019 juntos. Não foi falta de inspiração, ou de tempo. Inspiração havia de sobra, mas chega uma hora que cansa e não é legal ficar se repetindo quando os temas são sempre algo que não me tira desse lugar comum. Não falo das caveiras, que são divertidas, mas sim dessa coisa do ego de querer transpor para as telas e papéis o que o artista sente, na esperança de esbarrar com um pouco de empatia na observação do Outro, que por sua vez será resumida na automação digital de uma mera curtida. Ah, eu sei, também me limito ao like.

Então, tantas ideias ficaram na gaveta, nos esboços, para não dar voz a esses sentimentos, pelo simples fato de que seria tudo em vão. Um grito em capslock, de alguns segundos de vida, facilmente ignorado pela próxima publicação no feed.

Existe uma relação entre sonho e planos que está intimamente ligada à ideia de reconhecimento. A falta de reconhecimento gera insegurança. Inseguro, o sujeito adia projetos, fica ancorado no porto, entediado, reduzindo expectativas, acostumando-se com o não sair do lugar. Até que o sujeito tenta algo diferente, na esperança de que os ventos o levem para outro lugar. É um preferir estar perdido do que não ser bem vindo.

O plano aqui é não fazer muito sentido!